sábado, 31 de outubro de 2009

Gênesis 3



Se você ainda acha que a história não está avacalhada o suficiente, quem sabe agora: Animais falantes! É assim que Gênesis 3 começa. “A serpente era o mais astuto de todos os animais dos campos que o Senhor Deus tinha formado. Ela disse a mulher: ‘É verdade que Deus vos proibiu comer do fruto de toda árvore do jardim?’” (Gênesis 3:1). Papo vem, papo vai, a mulher cai no golpe da serpente e come o fruto da árvore-da-ciência-do-bem-e-do-mal (nome comprido, né?). E ainda “(...) o apresentou também ao seu marido (quando eles casaram mesmo? Perdi essa parte!), que comeu igualmente” (Gênesis 3:6).

Antes de continuarmos, só um adendo. Eu não gosto de pegar no pé de divindades, mas veja só: Deus colocou a tal árvore proibida no jardim do Éden, certo? Deus também colocou um animal (falante, eu insisto) cheio de malemolência nesse mesmo jardim, certo? Desculpe, mas não precisa ser nenhum engenheiro para ver que a merda estava feita. Cedo ou tarde a coisa ia desandar.

E desandou. Tamanho foi o revertério que fruto causou na barriga dos dois, que eles finalmente perceberam que estavam nus! E “tomaram folhas de figueira, ligaram-nas e fizeram cinturas para si” (Gênesis 3:7). (Exatamente! Então se você está aí nu enquanto lê este blog, pode ir já pegar uma folha de figueira e cobrir suas vergonhas!) E apesar de tanto pudor, não achei nenhum versículo que dissesse que o homem reclamou do topless da mulher. Mas enfim, isso é só minha mente maculada trabalhando. Voltemos à novela.

O homem e a mulher escutaram os passos de Deus, que estava dando uma voltinha e curtindo a brisa da tarde (mesmo!), e se esconderam nas árvores. Mas Deus, já sentindo cheiro de encrenca, chama pelo homem que se entrega e diz “Ouvi o barulho dos vossos passos no jardim; tive medo, porque estou nu; e ocultei-me” (Gênesis 3:10). O Senhor, em sua sapiência, percebe que tem gato nessa tuba e começa o interrogatório: “Quem te revelou que estavas nu? Terias tu porventura comido do fruto da árvore que eu te havia proibido de comer?” (Gênesis 3:11). “Responde, filhadaputa!” eu teria adicionado.

O homem, num ato de covardia digno do primeiro ser humano da terra, não hesita em dedurar a mulher logo de cara: "A mulher que pusestes ao meu lado apresentou-me deste fruto, e eu comi” (Gênesis 3:12). Ah safado! A mulher, vendo que o homem se livrou rapidinho, passa a batata quente para a serpente: "A serpente enganou-me,- respondeu ela - e eu comi." (Gênesis 3:13). Deus ficou puto. Se podemos tirar alguma lição deste livro, é que emputecer Deus é um péssima idéia. De nada adiantou o homem, a mulher e a serpente ficarem jogando a culpa um no outro. Deus resolveu foder a vida dos três.

A serpente, “serás maldita entre todos os animais e feras dos campos; andarás de rastos sobre o teu ventre e comerás o pó todos os dias de tua vida. Porei ódio entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta te ferirá a cabeça, e tu ferirás o calcanhar" (Gênesis 3:14-15). Tomou? Aparentemente, a serpente tinha pernas e esse corpo esguio e rastejante que conhecemos hoje foi uma maldição divina. Ô castigo! Além disso, se o objetivo do Senhor Deus era criar uma inimizade entre a mulher e a cobra, o tiro saiu pela culatra.

Para a mulher, Deus, em sua ira, lançou: “Multiplicarei os sofrimentos de teu parto; darás à luz com dores, teus desejos te impelirão para o teu marido e tu estarás sob o seu domínio” (Gênesis 3:16). É isso mesmo. A mulher estará sob o domínio do homem. Um conceito perfeitamente aceitável se você vive numa tribo no oriente médio há milhares de anos atrás, quando uma mulher valia pouco mais que um bom camelo. Ainda bem que ninguém mais leva esse livro a sério hoje em dia! E, por falta de evidências históricas, só me resta supor que o seguinte diálogo aconteceu entre o homem e o Senhor:

- Deus, aquela história de multiplicar os sofrimentos do parto e tal... Você vai aumentar o tamanho da cabeça do neném ou diminuir a...?
- Vou diminuir a...
- YESSS!!!

Mas o Senhor interrompeu a alegria serelepe do homem ao dizer: "Porque ouviste a voz de tua mulher e comeste do fruto da árvore que eu te havia proibido comer, maldita seja a terra por tua causa. Tirarás dela com trabalhos penosos o teu sustento todos os dias de tua vida. Ela te produzirá espinhos e abrolhos, e tu comerás a erva da terra. Comerás o teu pão com o suor do teu rosto, até que voltes à terra de que foste tirado; porque és pó, e pó te hás de tornar” (Gênesis 3:17-19). É isso, meu amigo. O homem, que levava a vida na flauta, saltitando pelo Éden, balançando seu pirulito para lá e para cá, vai ter que começar a pegar no batente! E tudo isso porque ele cometeu o erro de ouvir a voz da mulher! Esposa aqui não pode nem abrir a boca.

Finalmente, aprendemos os nomes dos nossos heróis. “Adão pôs à sua mulher o nome de Eva, porque ela era a mãe de todos os viventes” (Gênesis 3:20). Se isso não fez o menor sentido para você também, ótimo. Então Deus, achando que as folhas de figueira eram muito sensuais e sem o menor problema em usar casacos de pele, “fez para Adão e sua mulher umas vestes de peles, e os vestiu. E o Senhor Deus disse: ‘Eis que o homem se tornou como um de nós, conhecedor do bem e do mal. Agora, pois, cuidemos que ele não estenda a sua mão e tome também do fruto da árvore da vida, e o coma, e viva eternamente’" (Gênesis 3:21-22). Alto lá! “Como um de nós” quem, cara pálida? Com quem Deus está falando? Com outros deuses? Nem chegamos na parte da Santíssima Trindade e já podemos jogar o monoteísmo pela janela! E Deus, sabiamente, não quer que seu pet viva eternamente. Se bem que, se isso fosse uma preocupação minha, eu teria escolhido um hamster.

Tá cansado? Eu também, mas já está acabando. Deus então dá o primeiro pé-na-bunda da história e expulsa Adão e Eva do Éden e, provavelmente por ordem da seguradora, coloca querubins armados até os dentes protegendo a árvore da vida eterna. Tenha medo!

Nesse capítulo vimos como e porque a humanidade vive neste mundo cheio de filas de banco e internet lenta, e não no paraíso. O texto deixa claro, mais de uma vez, que a mancada da mulher foi o estopim para toda a miséria e desgraça do planeta. Podíamos deixar de hipocrisia e rebatizar “O Pecado Original” para “A Cagada de Eva”. Mas cá pra nós, preciso advogar em defesa da portadora da primeira mitocôndria. Imagine que um adulto entrega uma caixa de fósforos para duas crianças, chamadas Adão e Eva, brincarem. Eva risca um fósforo e queima Adão. Quem é o imbecil da história? Obrigado.

Para terminar, recapitulemos o que Deus disse para Adão em Gênesis 2. Se o homem comesse o danado do fruto ele morreria “indubitavelmente”. Ele não morreu. Além de irresponsável e vingativo, podemos adicionar mentiroso à lista de adjetivos para o nosso bom Deus.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Gênesis 2

Neste capítulo "O Senhor Deus formou, pois, o homem do barro da terra, e inspirou-lhe nas narinas um sopro de vida e o homem se tornou um ser vivente" (Gênesis 2:7). Isso mesmo, fez um boneco de barro, uma RCP meio torta e voilá! O homem! E, de quebra, ainda fez um jardim do Éden para o seu novo pet viver.

Nesse jardim havia a árvore da ciência do bem e do mal (heim?) e, sobre ela, Deus falou o primeiro de muitos "Nananina-não! Não pode!". Veja: "Podes comer do fruto de todas as árvores do jardim, mas não comas do fruto da árvore da ciência do bem e do mal porque no dia em que dele comeres, morrerás indubitavelmente" (Gênesis 2:16-17).

Ok, pó-pará! Por que diabos (sim, eu sei) Deus plantou essa tal árvore em primeiro lugar? Sugestão do paisagista? Ou para testar o homem (olha o nosso Deus cientista aí gente!)? Ou para ter o prazer autoritário de dizer “Não pode! Rá!”? É como um botão que diz “não aperte esse botão”. Ou como um bolo com calda de chocolate que a criança não pode passar o dedo. Ao longo de nossa saga, veremos como Deus gosta desses joguinhos. Enfim, voltemos a ela.

Depois de deixar seu pet cagando de medo, Deus disse: "Não é bom que o homem esteja só; vou dar-lhe uma ajuda que lhe seja adequada.” (Gênesis 2:18). Então o Todo-Poderoso e o homem olharam todos os animais em busca dessa tal ajuda. Deus aproveitou a deixa para fazer uma revisão taxonômica e deu nome a todas as espécies. Pergunto-me se o homem tinha um caderninho ou se ele decorou tudo mesmo (chutando bem baixo, existem cerca de 20 milhões de espécies de organismos no planeta). Mas a verdade é que “(...) não se achava para ele uma ajuda que lhe fosse adequada” (Gênesis 2:20). Deus, astuto que é, veio com a solução: “Então o Senhor Deus mandou ao homem um profundo sono; e enquanto ele dormia, tomou-lhe uma costela e fechou com carne o seu lugar. E da costela que tinha tomado do homem, o Senhor Deus fez uma mulher, e levou-a para junto do homem” (Gênesis 2:21-22).

Está confuso? Zonzo? Náuseas e dores lombares? Eu vou sintetizar para você. Deus resolve que o homem precisa de um ajudante; nenhum animal serve; Deus faz a primeira anestesia geral da história, arranca uma costela do homem e faz a ajudante perfeita: a mulher! E ainda dizem que a Bíblia é machista? Blasfêmia! Até imagino como foi Deus e o homem buscando um ajudante:

- Olha aqui, homem, esse animal, que se chama vaca a propósito... isso... va-ca... é perfeito, modéstia a parte! Dá leite, puxa carroça e, no rolete, fica um pecado!
- Um o quê?
- Deixa pra lá. Mas e aí? O que achou?
- Hmm... sei não... muito grande... não cheira muito bem... só faz ‘muuu’...
- É... vendo por esse ângulo... Já sei! Faz assim, vai dormir e, quando você acordar, vai ter um ajudante muito melhor que uma vaca!

É, pois é. Mas o melhor deste capítulo é o desfecho. “O homem e a mulher estavam nus, e não se envergonhavam” (Gênesis 2:25). Isso, você leu direito. Eles estavam nus e... atenção! Está sentado? Lá vai... NÃO SE ENVERGONHARAM!!! Mas COMO?!? Sério, me poupe. Não quero estragar surpresas vindouras, mas essa mamata de ficar pelado e sem culpa vai acabar já já. Aliás, espero que esteja com a coluna boa, porque toneladas de culpa vem aí para você carregar nas costas. Mas tem tempo ainda. Recomendo pilates.

sábado, 24 de outubro de 2009

Gênesis 1

Nossa fábula começa com Deus criando os céus e a terra, dizendo "faça se a luz!" e tudo aquilo que todo mundo já está careca de saber. Mas, trocando em miúdos, Deus, em seis dias de extrema produtividade, criou o mundo como o conhecemos.

Ou melhor, como as pessoas no oriente médio, pouco depois da idade do bronze, o conheciam. Hoje em dia sabemos que a Terra é redonda, orbita em volta do Sol (a fonte da tal da luz, lembra?), que o sistema solar está em uma das bilhões de galáxias que existem no universo, entre outras recentes, quentinhas e bombásticas descobertas da ciência! Desculpe, não queria te derrubar da cadeira com tantas novidades. Fica meio difícil encaixar essa fábula num contexto cosmológico. Mas enfim, não pretendo discutir as incoerências científicas do livrão (mas acho que cedo ou tarde irei cair em tentação!). Bola pra frente!

O mais interessante nesse começo é que várias vezes "Deus viu que era bom"! Exatamente! Ele criou a luz meio na cega (desculpe, piadinha inevitável) e depois, pasmem, viu que era bom! Ele, apesar de sua famosa onisciência, não sabia se a luz era boa ou não, pensou "quer saber?" e Shazam!, criou a luz! "Olha! Não é que é bom esse negócio de luz?". E assim fez com as ervas, árvores, estrelas e o escambau. Criou, e viu que era bom! Deus estava experimentando, o que faz dele o primeiro cientista de todos os tempos, não é irônico? Já estou gostando desse cara!